quarta-feira, 19 de dezembro de 2007

Conto de Natal

Escrito a (...ora, três pessoas...) seis mãos na aula de Sistema Jurídico da U.E. Seis mãos, não, três pessoas a precisar de férias. A primeira parte. Porque 80% é da minha autoria, naquela meia hora tão produtiva de espera pelo autocarro. E uma parte no autocarro. A parte final é já de completo estado de alienação e inconsciência de sexta-feira à noite de última semana de aulas. Enfim. Insanidade. Absoluta. Fica aqui, tal e qual como foi escrito. Ah. E não há erros de ortografia ou contexto. Está mesmo como foi escrito.

Azul - Meu, Margarida.
Preto - Nice.
Vermelho - Inês.

Conto de Natal

Era véspera de Natal. E estava a nevar. Mas não estava frio.
Estava um calor desgraçado, uma calamidade assassina de idosos. Tempo estranho aquele, o do Inverno de 2025, neve e calor.
Os cientistas andavam muito atarefados, mas chegaram a uma conclusão antes do ano novo. Parecia que os acontecimentos resultavam de alterações climáticas. O mundo acreditou. O "Bâshe" não.
*FIM*
Não. O fim ainda não chegou. Certos cientistas com barbas estranhas e sem TV em casa, o Pacheco Pereira e um primo do prof. Marcelo que conhecia um senhor na NASA apregoavam o fim do mundo. Mas o fim ainda não tinha chegado.
Joaquim Panda, um génio português, estava no seu laboratório em Vichy quando um floco de neve lhe caiu no nariz. De facto, caiu-lhe o nariz.
"Tenho de mandar arranjar o tecto" pensou.
Voltou a olhar para a rena que estava a preparar para a consoada. Foi quando viu o nariz. Às 21:37 Joaquim Panda teve uma revelação chocante, a epifania científica do século. Aquilo não era neve. O céu estava a nevar. Era o apocalipse. Apenas se salvariam os jeovás. A humanidade estava condenada; os parolos perpetuariam a espécie.
Fulminado com a revelação, Joaquim Panda tirou as luvas de jardinagem e correu para a sala. Agarrou na lata e gritou:
"HEY! ESTÁS AÍ?"
Do outro lado, respondeu-lhe o seu velho amigo, o Papa Guterres IX:
"HEY! COMO VAIS?"
"BEM. OLHA, OS JEOVÁS CELEBRAM O NATAL?"
"AH? NÃO TE ESTOU A OUVIR. ESTOU A FICAR SEM FIO."
"OS-JEOVÁS-CELEBRAM-O-NATAL?"
"PASCOAL? NÃO, NÓS ESTE ANO VAMOS COMER RENA."
O braço de Joaquim Panda caiu. O buraco no tecto ainda era considerável. O buraco no céu não parava de crescer. Não havia tempo a perder. Joaquim Panda pôs o braço no sítio, calçou as botas de borracha, enterrou a cartola na cabeça e saiu à procura do amigo Piaf Pardale Lupin. Estudava as religiões do séc. XX, ele saberia a resposta.
Piaf Pardale Lupin estava no seu bungaloo, ou lá como se chama, no meio do Armazém (ilegível), sentado no seu "lazy boy" cor de vinho verde a ler o livro que a revista TIMES chamou de livro mais importante desde "Este Jesus que vos fala" da Santa Alexandra Solnado. O livro era da Mártir Mirita Vaz e o Dr. Lupin, como grande mente das religiões do séc. XX, lia e chorava baba e ranho.
Quando Joaquim Panda se aproximou levou com um pontapé nas virilhas dado pelo robot-guarda ou robota-guarda porque não se sabe...é uma daquelas she-male, muito em voga quando a Fac. de Direito despedia a sua mascote: Maria José Mesquita.
Agoniado com a dor, Joaquim Panda esqueceu-se por momentos do que o levara ali, perdido em reminiscências daquela que, fora um dia, tinha sido o grande amor da sua vida: Mª José Rangel de Mesquita: a Mimi. Nunca lhe perdoara o dia em que ela o trocou pelo maior latinus rocker da sua geração, Quintinus Juris. Ainda hoje não podia ouvir "Americanus eunt domus". "Americanus eunt domus, ne varietur, americani eti domum, americanus eunt domus"... Uma farsa.
De volta à realidade com um segundo pontapé, Joaquim Panda contorceu-se uma segunda vez com dores. O robot, já distraído a espancar o coro infantil de Sto. Amaro de Oeiras on tour pelas ruas de Vichy, foi prontamente esmagado com uma pá.
"Estúpidos robots" resmungou Joaquim Panda "quem me dera que aquele idiota do Joe Berardo nunca tivesse metido o nariz onde não era chamado."
"Era um bom robot" comentou Piaf Pardale Lupin assoando-se.
"Um idiota maníaco." Joaquim Panda voltou-se para Piaf Pardale. "Piaf, preciso da tua ajuda. Os jeovás celebram o Natal?"
Piaf corou, torcendo o lenço entre os dedos.
"Eu...bem, eu...eu não sei."
"Não sabes?! O que queres dizer com 'não sei'?! Fizeste o doutoramento sobre os jeovás e o Natal e estás a dizer-me que não sabes?"
Piaf vermelho, deixara cair o lenço, torcendo já e só os dedos.
"Eu...a culpa não é minha, Panda. A autora não sabe e não tem nenhum jeová por perto para perguntar."
"Francamente!" gritou Joaquim Panda "Não suporto esta autora! Que grande idiota. Teve aí umas seis oportunidades para dar a volta à história. E em vez disso, insistiu neste disparate sem imaginação."
Piaf desviou a Laura Bâshe insuflável do sofá, sentando-se.
"Tenta compreender" suspirou "a faculdade está a dar-lhe tanto que fazer...e, admitamos, há dois anos atrás tu e eu seríamos anjos a tentar salvar o mundo. Podíamos...podíamos..." Piaf estremeceu, respirou fundo e continuou "podíamos estar num daqueles contos de fadas dela."
Joaquim olhou Piaf.
Não digas isso" disse-lhe muito sério "não lhe dês ideias. Sabes bem do que ela é capaz."
Piaf olhou Joaquim.
"Ridículo!" gritou Joaquim "RIDÍCULO! Que espécie de conto de Natal é este?! Estamos há vinte linhas a discorrer sobre a autora. Cabra egocêntrica!"
"Panda!"
"Desculpa lá Piaf, mas acho que vou voltar para casa. Isto tornou-se num disparate. O Natal é suposto ser sobre amor, redenção, esperança, luz..."
Joaquim foi interrompido por uma luz intensa que vinha lá de fora. Piaf levantou-se e, seguido por Joaquim, espreitou pela janela.
"Será que o robot tinha o microondas ligado?"
"Não sei...não consigo ver nada. Mas já tínhamos ouvido o 'plim', não?"
"Sim, tens razão. Será que o Padre Putine conseguiu os fundos para o presépio? Era mesmo dele convencer uma estrela a passar a consoada num estábulo em Vichy."
"Só não entendo a música."
"Música?"
"Sim, não ouves? Será que Deus ainda vem à Terra antes de acabar com tudo?"
"Acabar com tudo? Do que é que estás a falar, Joaquim?"
"Não te disse? Foi por isso que vim aqui. O mundo vai..."
"HEY!"
Piaf e Joaquim saltaram, olhando sobressaltados para trás. A porta pendia, partida. À porta estava o que parecia um elfo mal-humorado do Pai Natal. Talvez fosse por estar vestido de cor-de-rosa.
"Conhecemo-nos?" perguntou Joaquim Panda levantando uma sobrancelha.
"Claro que me conheces!" gritou a criatura "Sou a autora, idiota! Caso não te lembres, eu apresentei-te como um génio!"
"A autora?" repetiu Piaf surpreendido "Desculpe, mas...mas...partiu-me a porta."
"E se te pões com picuinhices, parto-te o nariz."

Piaf recuou, aturdido. Não estava habituado a tão maus modos. A autora virou-se de novo para Panda, esticando-lhe o dedo. Panda olhava-a furioso.
"E tu, meu menino, que história é essa de me andar a chamar 'cabra egocêntrica' na minha própria história, hum?"
Panda enrubescido, brilhava de raiva. Piaf olhava-o, visivelmente preocupado. Panda abriu a boca, voltou a fechá-la e engoliu em seco. A autora cruzou os braços, encostando-se a um Hades laranja que escondia a velha lareira inútil, à espera de uma resposta. Subitamente a expressão de Panda alterou-se, começando a rir nervosamente.

"És tão idiota. Não vês que és mesmo uma cabra egocêntrica?"
"HEY!"
"Isto era suposto ser um conto de Natal e, agora, aqui estás, a meter-te na história."
"Seu...ah...que lata! Obrigas-me a vir aqui e ainda aproveitas isso."
Panda continuava a rir. A autora, desconcertada, tropeçou num aspirador com vestígios de uma recente explosão. Panda prosseguiu.
"Além do mais és muito idiota. Olha para mim e tenta ver o que está errado."
A autora fitou-o, franzindo as sobrancelhas. Realmente, algo não estava bem em Panda.
"Então?" sorriu Panda.
Arregalando os olhos, a autora corou até à raiz dos cabelos.
"Um nariz" Puseste o meu braço no sítio e não foste capaz de me devolver o nariz. Que estúpida. E o Piaf nem notou. Francamente, que péssima autora."
Piaf olhou para Panda como se o visse pela primeira vez.
"Panda? O que é que aconteceu ao teu nariz? Espera, vou procurar um. Acho que sobrou um do nevão passado."
Joaquim Panda sorriu triunfante.
"Obrigado" disse.
A autora fitou-o impassível, obviamente humilhada com a situação. Na cozinha, Piaf Pardale remexia em armários e gavetas.
"Ah! Achei!" gritou. Voltou à sala com uma bola vermelha luminosa."Não é muito discreto, desculpa, mas é o único que tenho, era da rena do ano passado. Muito tenrinha, por acaso. Devia experimentar aquele molho de novo."
Enquanto tagarelava passou-o para as mãos de Panda, que apertava os lábios, pálido.
"De nada" riu a autora.
Panda fechou os olhos, ajeitando o novo nariz. Piaf procurava a receita de molho do ano passado. A autora voltou a dirigir-se a Panda e ao seu luminescente nariz vermelho.
"Só para teres uma ideia de quem manda aqui" disse pomposamente. " E agora faz favor de continuar a história como deve ser".
"A HISTÓRIA É ESTÚPIDA, DEVIAS ESTAR A ESTUDAR, CHEGASTE NUMA NUVEM DE LUZ, FALASTE COMO SE DEUS ESTIVESSE A CHEGAR E CONTINUAS SEM SABER SE OS JEOVÁS CELEBRAM O NATAL!" berrou Panda impaciente, fazendo reluzir o seu nariz novo.
"Diz o que quiseres. Quem escreve a história sou eu e vais fazer o que EU quiser. Adeusinho. Adeus Piaf. Feliz Natal."
Desviando-se da porta partida, a autora desapareceu por entre a neve que caía agora mais impiedosamente do que antes. Piaf Pardale olhou inquisitivo para Joaquim Panda.
"E agora?"
"Bem Piaf, agora nós...Bem, basicamente temos de..."
Panda apertava o nariz, nervoso, irritado e confuso. Instalou-se um silêncio. Nervoso, irritado e confuso. De cima, veio um estalido impaciente da autora.
À porta surgiu um oficial inglês vestido de verde dos pés à cabeça.
"Não, não, não!" berrou Panda "Não envies o Chapman, nós conseguimos muito bem avançar sozinho."
O oficial recuou e desapareceu.
Joaquim Panda respirou fundo.
"Piaf, o mundo vai acabar. Não é neve que está a cair, é o céu que está a nevar, Piaf."
"O céu? O céu está a cair? Por Toutatis!" exclamou Piaf (Piaf Pardale Lupin estudava religiões do séc. XX, mas era um gaulês).
"Sim Piaf" continuou Panda "o céu está a cair. E a razão para eu querer saber se os jeovás celebravam o Natal ou não era porque tinha um plano. Só eles é que se vão salvar, sabes?"
"Porquê?" Piaf estava intrigado. O seu amigo não estava a fazer sentido.
"Bem, foi o que a outra autora disse. Só os jeovás. Acho que foi por causa da aula, das circunstâncias da aula." justificou-se Panda.
"A outra autora não está aqui. Podemos esquecer essa parte. Porque, como devias saber, todos os jeovás morreram há uns anos. Não sobrou nem um. Aquela história de equipararem a SIDA às vacas loucas, não era difícil adivinhar aquele final trágico...Alfama nunca mais foi a mesma." Piaf suspirou "Enfim. O mundo está a acabar, é véspera de Natal. O que é que podemos fazer para salvar o Natal? E o mundo. Claro."
Panda começou a caminhar em círculos à volta do globo que Piaf mantinha no centro da sala. Também pensativo, Piaf Pardale Lupin caminhou de mãos atrás das costas até à janela, espreitando de novo lá para fora
Passaram-se minutos nos quais aquelas duas mentes geniais fervilharam em silêncio à procura de uma ideia que pudesse salvar o Natal.
"Vamos por partes, Piaf." recomeçou Panda.
"Muito bem."
"Temos um problema. O que é esse problema?"
"A neve. A neve é o céu a cair"
"E porque é que o céu está a cair?"
"Apocalipse. O mundo está a acabar."
"E porque é que o mundo está a acabar?"
Piaf ficou em silêncio. Reticente, encolheu os ombros.
"Não sei. Deus está aborrecido? Ou a festa de aniversário de Jesus desta vez foi longe demais?"
"Hum. É difícil saber. Mas já vimos do que precisamos: de um milagre de Natal." afirmou convicto Joaquim Panda.
Piaf sentou-se numa pilha de livros poeirentos sobre o Elvis. Exasperado perguntou:
"Onde é que vamos arranjar um milagre de Natal a esta hora? Lourdes está fechado. Fátima está fechado"
"O Guty está sem fio." acrescentou Panda.
"Podíamos ajudar pobres e sem-abrigo" começou Piaf "mas os campos Chávez fecham às 20h."
"Onde é que vamos arranjar um milagre de Natal sem pobres?" exclamou Panda, surpreendido por nunca ter pensado nesse problema antes.
"Joaquim, é o fim. A autora está exausta, não dorme há noites. Só temos uma solução."
"Ler Dickens. Eu sei."

2 Comments:

  1. Daniel Paiva said...
    foste insultada pelos teus próprios personagens? pffff
    Anónimo said...
    Ilegível? Ilegível?! Como te atreves?! Estragas-te o Conto de Natal todo por não teres posto o nome do Armazém! Espero que consigas viver com este erro na tua consciência. Daqui a muitos anos vais acordar sobressaltada uma noite e vais ter remorsos por teres corrompido a versão original deste belo Conto!!!!



















    Estava muito bom, gostei particularmente da maneira como foste achincalhada pelas personagens. Muito à frente até mesmo para uma doida como tu :P Imagino as velhas que não assustas-te a escrever isto na paragem, pobres almas.
    Beijos :D *********

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